A BUSCA DO EQUILÍBRIO COMEÇA COM O COMEÇO DA VIDA


A BUSCA DO EQUILÍBRIO COMEÇA COM O COMEÇO DA VIDA


Tive um sonho no qual eu aparecia como sou, professor, tentando pôr na lousa uma síntese das idéias de Melaine Klein (1882 – 1960), famosa psicanalista judia nascida em Viena e falecida em Londres.
Havia na classe da Poli (Politécnica de Jundiaí) 10% do total de alunos, e eu me esforçava para pôr no quadro-negro um resuminho das idéias de Melaine. Nesse momento, ela, como num passe de mágica, desce do teto, deixando todos nós boquiabertos. Olha-me bem e diz num português sem sotaque alemão:
“Venho a você e aos seus alunos para explicar a principal diferença entre a minha teoria e a de Freud. A minha desloca o foco de atenção para as relações objetais. O bebê busca o alimento para se manter vivo, e o tipo de relação que estabelece com o seio da mãe é o que determina seu prazer ou raiva. Estas imagens e emoções dos primeiros meses de vida existem de modo excludente no ato de mamar. Por isso dei à posição inicial o nome de esquizoparanóide (esquizo = dividido; paranóide = a ansiedade produzida pelo medo de ataque, no caso, o seio materno; ou seja, um estado parecido com a antigamente chamada paranóia, o de transtornos delirantes de ciúme, grandeza e perseguição).
“Pelo exposto, você e seus alunos percebe que não sou uma teórica obcecada pela sexualidade no conceito freudiano. As emoções dos 4 primeiros meses são do tipo 8 ou 80. Depois dos 4, há uma fase a que chamei de depressiva e que vai até 8 meses. Chamei-a de posição depressiva, que explico do seguinte modo: a criança muda sua posição em relação ao objeto (seio), porque tem a mãe total e percebe que dela depende. Então a agressividade da fase anterior é superada por um sentimento de culpa e gratidão que estarão presentes pela vida afora”.
“Se o indivíduo ficar preso à posição esquizoparanóide, terá transtornos esquizofrênicos; e se não conseguir ver a mãe como um objeto total bom e mau simultâneamente, poderá caminhar para a depressão. Mas creio que na maioria dos casos há um certo equilíbrio na posição depressiva”.
“Como se vê, para mim o ego não é exatamente como o definiu Freud. Ele opera desde cedo e não a partir de uns dois anos. Procura manter o equilíbrio entre as pulsões que exigem satisfação e as possibilidades de tê-la com objetos do mundo exterior, principalmente as pessoas. Enfim, o ego é mais ativo do que na visão freudiana”.
“Assim, meus caros, fiz o que Jung disse: antes de ver a busca de prazer para viver, vi a vontade de viver da qual pode decorrer o prazer ou o ódio. Estaria eu errada?”.
Despediu-se e saiu por onde entrara: o teto. Voltou assim à dimensão que está além do que enxergam os olhos normais.
Acordei e logo fui procurar nas obras de Jung o texto em que ele diz que ao invés de primeiros falarmos em prazer devemos falar em fome. Mas, ao ler o parágrafo 771 do seu livro Freud e a psicanálise*, esqueci o que procurava e li:
“No tocante à Psicologia, acho melhor renunciar à idéia de que estejamos hoje em condições de fazer afirmações ‘verdadeiras’ ou ‘corretas’ sobre a essência da psique. O melhor que conseguimos fazer são expressões verdadeiras”.
Como qualquer leitor de Kant, Carl Gustav Jung poderia dizer que a Psicologia não nos diz o que somos, mas nos oferece dados e instrumentos para que sejamos capazes de equilibrar nossa mente, nos ajustarmos à vida social, estabelecermos um projeto de vida e sermos felizes.
Conhecer nossos problemas e transtornos pela raiz é importante desde que o entendimento seja acompanhado de mudança em nossos habituais comportamentos.



* Cap. XVI da obra citada (A divergência entre Freud e Jung), texto publicado pela primeira vez em 1929.



ABORDAGENS PSICOTERÁPICAS NO CASO ALEXANDRA – RASPUTIN


ABORDAGENS PSICOTERÁPICAS NO CASO ALEXANDRA – RASPUTIN


Talvez o caso Alexandra – Rasputin seja o mais interessante para explicar os principais tipos de abordagem que orientam o trabalho psicoterápico (analítico, existencial – humanista, ou fenomenológico, comportamental e cognitivo).
Grigori Iefimovitch Novikh, o Rasputin (devasso, em russo) nasceu na Sibéria em 1872 e morreu em 30/12/1916 na então capital russa, São Petersburgo. Era semi-analfabeto e “tarado sexual”, segundo seus biógrafos. Monge da seita dos flagelantes, estava na capital desde 1903. Com sua longa barba e olhar penetrante, dizia-se possuidor de poderes divinos. Sua fama cresceu tanto que a mulher do Imperador Nicolau II, a czarina Alexandra, o chamou para cuidar do filho Alexandre, o qual, por ser hemofílico, adoecera.
Sob os cuidados de Rasputin, o menino superou a crise. E graças a esse fato, o monge passou a dominar a czarina e o czar, a tal ponto que em 1916 conseguiu nomear Stooner como Presidente do Congresso, a Duma. Aí, cavou sua própria sepultura.
Após várias tentativas, foi assassinado pelo príncipe Iussupov e o grão duque Dimitri.
Em 1917, caiu a monarquia russa, e no ano seguinte os bolcheviques tomaram o poder. Mais tarde, ainda sob o comando de Lênin, criaram a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS, CCCP, em russo). A família real (Romanov) foi presa e todos fuzilados pelos soldados do novo governo.

ANALÍTICA (PSICANÁLISE E DERIVADAS)
Para analisar o domínio de Rasputin sobre a czarina Alexandra, teria que ser feito um histórico da vida dela desde menina (método clínico). Sua insegurança revelava uma personalidade imatura, talvez uma vida sexual insatisfatória e um certo e inadequado sentimento de culpa pelo filho hemofílico. Não se sabe que tipo de relação tinha com Nicolau II, que era o causador involuntário da doença do filho.
O analista buscaria a história de vida da czarina com seus pais e procuraria ir às causas de sua personalidade dependente, “histérica”, sugestionável. Da mesma forma, a do seu marido, o czar.
Personalidades fracas, mulher e marido foram dominados por Rasputin, e assim lavavam as mãos nos seus momentos conflituais. Eram inseguros, e, como tal, sujeitos ao controle do monge, como são hoje pessoas com transtorno de ansiedade que se entregam a pseudo-religiosos, os quais as exploram porque as dominam por sugestionamento.
Em Rasputin, o czar e a czarina encontraram um “pai” amado, temido ou idealizado, que tudo decidia, e passaram a viver neuroticamente sob seu comando. Principalmente Alexandra, racionalizava e sublimava seu relacionamento com Rasputin, um “santo”, pois salvara o filho dela, uma infeliz. O desfecho dessa prolongada farsa veio com o assassinato de Rasputin, a prisão e fuzilamento da família Romanov.
Esta abordagem (analítica) visa avaliar os mecanismos de ajustamento do cliente, sua história de vida e a motivação de ser o que potencialmente é por mantê-lo emocionalmente criança.

EXISTENCIAIS – HUMANISTAS (ou FENOMENOLÓGICAS)
O que interessa é a situação política de momento (insegurança) e a personalidade dos envolvidos na história. A personalidade deles era como atuavam. De Alexandra, o psicoterapeuta teria de avaliar: 1- como ela se via (auto-imagem); 2- como via seu mundo; 3- e o quê desejava da vida. Em seguida, discutir com ela sua visão distorcida da realidade e extrair dela mesma o lado positivo, auto-afirmativo de sua personalidade. O objetivo seria mostrar-lhe como seus pensamentos construíram um mundo irreal sob a influência de Rasputin, que usava a hipnose para mantê-la submissa, assim como seu marido e filho.
A abordagem fenomenológica, ou existencial – humanista, visa avaliar a motivação consciente e os sentimentos atuais de um cliente.

COMPORTAMENTAL
Esta abordagem não trata da personalidade, mas dos comportamentos de Rasputin, como ele, por acaso, caiu nas graças da czarina Alexandra. Ele fez baixar a tensão (ansiedade) dela “curando” o filho. A partir de então, mãe, pai e o próprio menino Alexandre passaram a viver sob o controle dele, que manejava como queria as situações e obtinha os comportamentos que desejava, reforçando-os positivamente.
Esta abordagem metodológica trata de estímulos e respostas, e não levanta suposições sobre variáveis intervenientes.

COGNITIVA
Nesta abordagem, o importante é traçar o perfil motivacional, afetivo e de crenças do paciente. Com esse quadro da czarina seria possível exigir dela mudanças comportamentais, desde que ela avaliasse os fatores subjacentes de suas falsas crenças, motivação irreal e insegurança emocional, que respondiam pelo enfoque irrealista de si mesma e do seu mundo.

De acordo com cada abordagem são empregadas técnicas específicas de análise das experiências passadas (Psicanálise e abordagens dela derivadas), análise existencial (fenomenológicas) e modificação de comportamentos e idéias (comportamental e cognitiva).















* Lannoy Dorin é professor e jornalista

ABORDAGEM, TEORIA E ESCOLA EM PSICOLOGIA


ABORDAGEM, TEORIA E ESCOLA EM PSICOLOGIA


ABORDAGEM. Do francês abordage = ação ou efeito de abordar, de encostar o navio com o bordo, com um dos dois lados da embarcação. Sentido figurado: 1- vir para perto de em qualidade, caráter etc; 2- ponto de vista acerca de uma questão, uma teoria, um sistema explicativo; 3- modo ou método de enforcar, de tratar, de lidar, de interpretar. Inglês: approach.


ESCOLA. Do grego scholé = descanso ou o que no repouso se fazia. Em Psicologia, também se usa o termo para indicar um grupo de teóricos ou pesquisadores que possuem e defendem certos pontos de vista particulares.


TEORIA. Do grego theoria = o ato de ver, examinar, considerar, contemplar; theoréo = observar, olhar com interesse, considerar com inteligência, assistir, derivado de théa, espetáculo, e horáo, ver. Um conjunto coerente e sistematizado de princípios e leis explicativas de determinados fenômenos. Também é usado para uma lei única que explica um conjunto de fatos. É importante considerar que a teoria nasce da prática e a modifica, num processo dialético.
Lannoy Dorin –
No Dicionário de psicologia

etimológico e holístico

em vias de publicação (2003).


POR QUE A DIVERSIDADE DE TEORIAS


“...as diversas teorias psicológicas, algumas até opostas, não fornecem uma explicação científica que possa ser considerada definitiva ou absoluta e, conseqüentemente, uma previsibilidade sobre o comportamento, mas essas teorias apenas alcançam as quase – verdades sobre o comportamento, isto é, cada teoria psicológica, nessa perspectiva, pode ser considerada fraca, porque nenhuma delas chega a conclusões que possam ser consideradas absolutas. Em outras palavras: se houvesse uma teoria psicológica que alcançasse o conhecimento absoluto, o que implicaria na aceitação ( no sentido científico) dessa teoria por todos que estudam Psicologia, anularia todas as demais teorias”.

José Antônio Zago em
Sobre comportamento e cognição.
Santo André: ESEtec, 2002, p.214.

A BOA ESCOLA E O BOM PROFESSOR


A BOA ESCOLA E O BOM PROFESSOR



    Toda sociedade possui um sistema de educação, simples ou complexo, elementar ou avançado. Para que os homens continuem produzindo os bens de que necessitam, torna-se indispensável a contínua preparação de profissionais para todos os tipos de trabalho. Nenhuma sociedade poderia substituir, caso fosse privada dos instrumentos da cultura que aprendemos a manejar na escola e que são: linguagem oral simbólica (expressão de nossas idéias e sentimentos), escrita (gravação de nossas idéias e sentimentos), leitura (interpretação do que foi gravado), cálculo (medida do que é ou acontece) e manipulação (trabalho com as mãos).
Mas é um engano pensarmos que a educação se restrinja apenas à transmissão de conhecimentos e à formação de profissionais. Ela está voltada, em primeiro lugar, à formação da personalidade dos seres humanos que constituirão famílias. É preciso que eles aprendam como poderão constituí-las e como poderão educar seus filhos durante os anos em que estes permanecerão sob sua responsabilidade.
Formar o homem é a principal meta dos educadores; instruir estudantes e formar profissionais são os objetivos dos professores. Assim são, muitas vezes, teoricamente definidos os papéis de educadores e professores. Mas na prática um bom professor tem por escopo executar as duas funções, a de colaborar na formação dos traços de personalidade dos educandos (principalmente os de caráter) e levá-los a adquirir certos conhecimentos e habilidades para os diferentes tipos de trabalho em que poderão dispensar suas energias quando adultos. desde que os profissionais da educação estejam cônscios desses papéis que deverão desempenhar, os termos educador e professor poderão ser empregados expressando a mesma idéia geral. No momento em que o professor deixar de refletir sobre o significado do seu trabalho na formação da personalidade da criança ou do adolescente e se limitar apenas a transmitir conhecimentos, a informar, ele será um instrutor e não um educador. Embora muitas vezes se admita que a função do professor seja a de somente ensinar, os pais e as autoridades responsáveis pela educação empregam a palavra como sinônimo de educador.
Outro engano muito freqüente é o de identificar a educação como uma prática visando apenas a transmissão dos conhecimentos acumulados. Vista neste sentido, ela seria apenas um meio de se manter idéias, técnicas, valores e padrões de conduta social do passado. Se formos educar as novas gerações segundo todas as normas de nossa antiga educação, estaremos negando a sua principal função, que é a de preparar o homem para um dado momento histórico e provocar mudanças em vista de uma existência cada vez melhor da sociedade. Assim considerada, a educação consiste num processo de permanente transmissão e renovação de idéias, valores, técnicas, instrumentos, atitudes e padrões de conduta social (cultura).


Objetivos da educação democrática:
  • Integrar o ser humano em sua comunidade.
  • Ensiná-lo a viver socialmente.
  • Levá-lo a conhecer e a manejar os instrumentos da cultura.
  • Fazer com que compreenda sua natureza biopsicológica.
  • Fazer com que entenda a natureza da cultura e dos fatores socioeconômicos do seu ambiente.
  • Desenvolver nele uma adequada maestria para usar as habilidades adquiridas.
  • Criar nele hábitos de civismo, responsabilidade e dedicação ao trabalho e aos estudos.
  • Prepará-lo para os estudos em escolas técnicas ou Universidades.
  • Promover o desenvolvimento de um entendimento e uma adequada avaliação do seu eu.

Como deve ser uma escola?
“Plena de vida, de um viver real, porque, sem isso, não poderá oferecer as condições completas da aprendizagem.
Um ambiente propício à atividade dos alunos, onde seus empreendimentos formem unidades típicas da aprendizagem; será preciso não esquecer que a atividade com finalidade é o padrão de vida digna, onde quer que deva ser vivida.
Ter professores que, de um lado, nutram simpatia pela infância e pela juventude, cônscios de que o desenvolvimento só se dá pela atividade progressiva do aluno”... “E que tenham em mente, por fim, que a experiência e a cultura da espécie representam um tesouro de valor incalculável e fonte de provisão, nunca acabado ou perfeito, mas sempre disponível pra utilização mais rica e perfeita”.

E os bons professores?
Para se avaliar as possibilidades profissionais de um professor, podemos considerar 3 grupos de fatores, a saber:
  • Capacidade na área de conteúdo (assuntos da disciplina):
Escolaridade geral, medida pelos certificados de conclusão de cursos.
Pontos obtidos em testes de conteúdo.
Habilidade na leitura.
Cultura geral básica.

  • Fatores da personalidade
Traços de personalidade.
Interesse no ensino e no trabalho escolar.
Atitudes de análise em relação aos problemas sociais.

  • Capacidade no emprego de técnicas de ensino
Habilidade geral em instrução.
Habilidade nas relações aluno-professor.
Conhecimento das práticas profissionais e técnicas.

Na avaliação feita pelos estudantes de qualquer nível, sempre aparecem estas características do bom professor:
  • Tornam o curso interessante.
  • Sabem a matéria de que trata o curso.
  • Manifestam muito entusiasmo.
  • Têm o material muito bem organizado.
  • Incentivam a participação dos alunos.
  • Apresentam muitas ilustrações práticas.
  • Têm genuíno senso de humor.
  • Têm personalidade amistosa.
  • Mostram interesse pelos alunos.
  • Têm voz agradável.
  • Vestem-se bem.
  • Têm atitude ponderada e prática.

O que uma escola espera de um bom professor?

No exercício do magistério
  • Que tenha conhecimento de teorias da aprendizagem, técnicas de ensino e idéias sobre experiências e propósitos comuns dos aprendizes.
  • Conhecimento do significado, do processo e dos tipos de transferência da aprendizagem.
  • Estudo das matérias que ensinará.
  • Capacidade para elaborar seu plano de ensino, aceitando a participação de alunos no planejamento, através de informações obtidas sobretudo com a aplicação de questionários.
  • Capacidade para organizar atividades extra-curriculares em vista da melhor formação da personalidade do aluno.
  • Habilidades que lhe permitam organizar testes de aferição da aprendizagem.
  • E, finalmente, habilidades que lhe permitam guiar, estimular e encorajar as atividades dos alunos, tornando-os clientes dos seus deveres e possibilidades.

Na sua vida particular:
  • Bons hábitos de vida.
  • Voz agradável.
  • Senso de humor (rir com os outros, não dos outros).
  • Prontidão.
  • Inteligência.
  • Honestidade.
  • Interesse por problemas sociais.
  • Capacidade para avaliar as diferenças individuais.
  • Habilidade para avaliar os altos ideais, o viver digno e o pensar correto.
  • Amor ao belo.
  • Serenidade.
  • Reverencia a tudo que tenha valor cultural.

Quais seriam os motivos que levam as pessoas ao magistério?

Uma pessoa pode escolher a carreira de professor porque nenhuma outra profissão despertou sua vontade, nenhuma a atraiu. Mas muitos motivos podem justificar uma escolha desse tipo.

Imitação

Durante os anos de vida na escola a gente aprende a admirar um educador, a ver nele o bom amigo. Inconscientemente, passamos a pensar, sentir e agir como ele. Depois de algum tempo, estamos desejando seguir a mesma carreira profissional.
A imitação também pode ser do pai, quando este é um professor benquisto pelos alunos e pela comunidade.

Desejo de um melhor status econômico

O estudante que sempre lutou com dificuldade e jamais teve dinheiro em suas mãos, vê o magistério como um “porto seguro”.
A preferência pela carreira de professor, baseada no desejo de ganhar dinheiro, é responsável por sérios desajustamentos. O magistério não é uma profissão rendosa em qualquer parte do mundo.

Busca de prestígio social
Estudantes das classes economicamente baixas podem ver no magistério um meio de se projetarem, de serem reconhecidos socialmente, admirados e prestigiados. Uma vez formados e labutando nas escolas, poderão observar que o número de professores famosos é realmente pequeno.
Desejo de aprovação
Certas pessoas, que têm uma visão idealista do magistério, supõem que os alunos estão sempre prontos a manifestar sua gratidão aos mestres, mas poucos assim procedem, boa parte incentivados pelos pais. Os estudantes sabem que seus professores recebem salários para ensiná-los e geralmente não se sentem obrigados a agradecê-los. Os melhores alunos revelam admiração e respeito pelos bons professores depois que deixam a escola. E quase nunca expressam aos próprios mestres essas idéias e sentimentos.

O magistério como meio de canalizar impulsos maternais
Algumas pessoas, principalmente mulheres, podem escolher a profissão de professora como um meio de dar proteção às crianças. Obtêm prazer sendo bondosas para com as crianças e adolescentes. Se posteriormente vêm a se casar e a ter filhos, podem assumir atitudes opostas em relação aos alunos.

Apego a uma disciplina
A pessoa escolhe a profissão porque gosta de determinada disciplina e durante os anos de estudo só se dedicou realmente a ela.

O medo de tentar outros cursos
A escolha é feita porque o estudante percebe que é mais fácil ser professor que seguir outra carreira que exigirá mais estudo.

Outros motivos importantes
Finalmente, a pessoa pode escolher a profissão de professor por não ter tido oportunidade de fazer outro curso, porque gosta de conviver com crianças e adolescentes, porque sente-se feliz em estudar e transmitir seus conhecimentos, porque gosta de ajudar e ser auxiliada na solução de problemas sociais ou porque se sente uma pessoa útil ao seu país.
Ninguém nasce professor, ou melhor, com traços que responderão totalmente pela personalidade de mestre. Isto é evidente. Portanto, ser professor, bom ou mau, é questão de formação. Por princípio, admitimos que cursos bons poderão dar ao país bons mestres; cursos ruins, porcentagem menor de profissionais realmente habilitados para educarem as crianças e os jovens.


* Lannoy Dorin é prof. de Psicologia Geral e Psicologia da Personalidade no curso de Psicologia da Faculdade Politécnica de Jundiaí (SP).

A bíblia como campo de estudo

Lannoy Dorin

    Foi exatamente no início de 1950 que conheci o sr. José Castelo, recém-chegado a Tambaú, minha terra natal.
    Ele comprara o bar de seu Toninho Venturini, e pouco depois transformou sua sorveteria numa tribuna. Com o braço esquerdo erguido e o dedo indicador em riste, reduzia a pó aqueles que considerava exploradores da ignorância e ingenuidade do povo. Às 10 da noite, cerrava as portas do bar e, na companhia de três ou quatro livre-pensadores, fazia dele uma espécie de senáculo, do qual, evidentemente, era, tal qual Cícero, o grande orador.
    Seu Castelo – ou simplesmente Castelo, como eu o chamava – tinha um passado recheado de casos pitorescos, que me contava quando eu ia a seu bar, sob pretexto de tomar sorvete, aprender com ele um pouco de História. Pois foi numa gostosa conversa que me contou fatos sobre Eduardo Prado, dona Veridiana e a fazenda deles no município de Santa Cruz das Palmeiras.
    Anos depois, já na década de 60, lembrei-me de Castelo, suas histórias e a da família Prado. Então escrevi um artigo sobre esse fazendeiro e político, o qual foi publicado na Revista Brasiliense.
    Depois que deixei minha cidade, quando a visitava ia à noite ao bar do Castelo para atualizar minhas idéias sobre Política, Economia, Filosofia e até religião, no que era acompanhado por Evanir Prado Venturini, querido amigo, que em plena mocidade partiu deste “vale de lágrimas”.
    Numa noite de relâmpagos e trovões, Castelo disse a mim e a Evanir, meu caro Vaní, que a Bíblia nada tinha de sagrado. Era um livro comum, segundo ele.
    – Como pode ser santa, ou a voz do Senhor, como dizem, se nela só há histórias de pecado, traição, mentira, adultério, homicídio, sofrimento... Veja a história de Caim e Abel! A de Abrão, que expulsou Agar e Ismael! De Deus, mandando Abrão matar o filho Isaque e fazendo Jó perder tudo que tinha! De Labão, que enganou Jacó!...
    Como éramos jovens de pouca leitura, não podíamos contestá-lo. Apenas lhe perguntamos a uma só voz:
    – Então, como se explica ser o livro mais vendido no mundo?
    Ele sorriu e saiu pela tangente:
    – Propaganda bem feita por judeus e cristãos.
    O nosso bate papo foi longe e o que dele ficou foi esta observação de Castelo: “Bíblia é a história do povo judeu. É profana, desrespeitosa ao que é tido por alguns como sagrado à humanidade.”
    Anos depois, pensei em dizer a Castelo porque a Bíblia é importante para o estudioso da natureza humana, quer siga ele o Judaísmo ou o Cristianismo. Não pude fazer o que desejava: Castelo houvera partido para o outro mundo. Mas não me esqueci do meu pensamento. Ei-lo:
    – A Bíblia é uma grande obra porque, como a mitologia grega, revela um grande número de arquétipos, de motivos universais do homem. É um retrato de boa parte do inconsciente coletivo de nossa espécie. Se para o religioso são historias escritas pela vontade divina, para os historiadores, psicólogos e outros estudiosos, independentemente de confissão religiosa, são fatos ocorridos há séculos, são vivências dos homens, acontecimentos hiperdimensionados nas narrativas de sucessivas gerações durante milênios. São mitos, lendas. Isto não significa que não tenham existido, que são ficções, mas sim que, através dos tempos, foram adquirindo características fantásticas, graças à imaginação popular.
    Afora esse aspecto – de que a Bíblia revela boa parte do inconsciente coletivo, a humanidade que existe no mais profundo de nossa mente –, há que ressaltar o seu lado prático. Ela nos ensina como nos mantermos vivos com dignidade (Os 10 Mandamentos, por exemplo) e nos prepara para esperar tudo do próximo, seja do seu lado bom ou do lado mau.
    Há ainda um outro aspecto da Bíblia que merece ser mencionado, porque tratado em muitas obras – a simbologia, o que está por detrás de palavras e números, os seus vários significados. Estes são de tempos imemoriais e vão muito além dessa neblina, que turva nossa visão da realidade e que chamamos de presente.

A arte de ser feliz. (o abc do psicólogo)

Lannoy Dorin.

    O equilíbrio da mente, que aparece como um bom ajustamento social e um sentimento de auto-aceitação, depende da forma como: a) o indivíduo se vê; b) como vê os outros; c) como pensa que os outros o vêem; d) como os outros realmente o vêem; e) como os outros de fato são. Distâncias muito grandes entre a-b-c e d-e estabelecem o grau e o tipo de desajuste social e consigo mesmo.
    A primeira regra em vista do autoconhecimento é saber que são os outros que nos dizem como realmente somos. Quando nos analisamos, geralmente nos vemos como gostaríamos de ser (eu ideal). Em segundo lugar, quando me comporto não posso me analisar. Ou me analiso ou escrevo estas linhas. Quem pode descrever minhas reações é o outro. Posso dar-lhe algumas informações úteis, mas é ele quem diz como sou e o que sou. Aliás, nunca sou, pois estou sempre sendo. Como disse Karl Marx, o homem é o que ele faz. Somos o que os outros nos vêem fazendo.
    Cientes do acima exposto, podemos traçar os objetivos da higiene mental, que são:
Restabelecimento da saúde mental.
Prevenção de transtornos mentais e comportamentais.
Entendimento da importância da motivação como determinante do comportamento.
Compreensão de que o comportamento é função do todo individual, da personalidade e não de um traço apenas.

Em decorrência desses objetivos, é possível estabelecer algumas regras de saúde mental. Eis algumas que poderão tornar uma pessoa feliz:
Mantenha-se sempre em atividade.
Viva para além de si mesma.
Não perca tempo com coisas e fatos pequenos e inúteis, como mexericos. Caminhe realizando nobres ideais.
Nunca você chegará ao último degrau pulando os demais. E se usar de meios ilícitos, cairá mais cedo do que imagina.
Trabalhe produtivamente. O vazio existencial aumenta com a ociosidade.
Afaste-se dos que lhe fizeram algum mal. Odiá-los continuamente é ficar preso ao passado.
Seja bom, mas, acima de tudo, justo. A excessiva bondade nos transforma em carneiros. Sendo justos, ensinamos aos outros e a nós mesmos a medir a extensão e o grau de moralidade de nossos atos.
As razões desta vida estão nela mesma. Procure-as, que as encontrará.
O tempo é uma construção mental. O segredo é saber trabalhar com ele e não ficar preso pelo passado ou futuro.
Não envelhecemos devido ao tempo, mas ao desgaste do nosso organismo. Assim, podemos ser alegres e felizes mesmo quando contarmos muitos anos de existência. Ter ideais e sonhar é próprio da natureza humana, tanto que o homem das cavernas já sonhava com pássaros e borboletas.

A ansiedade neurótica

Lannoy Dorin.

    A marca principal da neurose é a ansiedade. Por isso as antigamente chamadas reações neuróticas são hoje designadas como transtornos de ansiedade. Mas, que é ansiedade?
    Ansiedade é a inquietação acompanhada de um medo vago, um medo subjetivo, por que, de momento, não há nada na realidade que o justifique. Poderíamos dizer, com S. Freud, que é uma reação antecipatória do perigo, que é um sentimento de aproximação do fracasso, do desastre. A pessoa se sente aflita, inquieta e não sabe por quê. Pelo menos quando não há uma causa real, atual, algo que talvez seja possível (perder o emprego, o exame médico indicar câncer etc.). Então ela é chamada de ansiedade neurótica.
    Ansiedade gera tensão e é gerada por ela. É um círculo vicioso, e o resultado é o estresse (stress), o desgaste do organismo em virtude da estimulação interna nociva.
    O alívio para os estados de ansiedade consiste inicialmente na remoção das dificuldades que interferem na satisfação dos desejos, o que nem sempre é fácil de se conseguir, pois o neurótico não sabe que para ser livre é preciso aprender a libertar-se dos desejos. Antes, porém, ele tem de precisar o que deseja da vida e em seguida estabelecer um projeto de existência significativa. Isto decorre da análise psicológica (psicoterapia).
    O segundo passo consiste em, simultaneamente à análise, cuidar do corpo. Exercícios físicos são fundamentais. Quais? Os da hatha-ioga, por exemplo.
    O terceiro passo é o do controle de alimentação. Escolha os alimentos equilibradores do corpo e da mente, os sattva, frutas, verduras, leguminosas e grãos.
    A ansiedade não combatida se converte em sintomas corporais, como anestesias em braços e mãos, dores musculares, como nas costas, mau funcionamento do aparelho digestivo, alteração no batimento cardíaco e outros, que levam à perda do apetite, ou o seu oposto, a insônia e a inibição do impulso sexual. As reações que afetam o equipamento sensorial e muscular são denominadas conversivas, porque a ansiedade ( o psicológico) se converte em reações corporais, orgânicas (o somático).
    Quando a ansiedade é mais forte ainda e mais duradoura, pode ocorrer o que se chama reação dissociativa, como nos casos de fuga ou de dupla ou múltipla personalidade. A parte que se dissocia é aquela que permitia o aparecimento da ansiedade. Então, é uma fuga de problemas, de frustrações e conflitos, alguns quase insolúveis, como dizer à mulher que teve um filho com outra. A saída pode ser a ruptura da personalidade, ficando apagados os traços (idéias, sentimentos e desejos) ligados à parte que convivia com o problema quase insolúvel.
    A dissociação geralmente é temporária. Ao recobrar a memória, a pessoa não se lembra que “saiu do mundo”, fugindo, ou tentando fugir do pensamento e do sentimento  geradores de ansiedade. Seria como uma máquina que se desliga por excesso de carga elétrica. Após algum tempo, ela volta a funcionar. Mas existe também a possibilidade de que, quando ela voltar a funcionar, ser outra máquina. Aí, meu (ou minha) caro(a) leitor(a), o neurótico mudou de status e de planeta: construiu uma casa em “outro mundo” e foi viver nela, já na condição de psicótico.